Carta Aberta em Defesa da Democracia

Brasil, Agosto de 2023  

Excelentíssimo Senhor Presidente da República
Luiz Inácio Lula Da Silva

 

Reinstala Já! Pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos

continua depois da propaganda

Conheça, assine e ajude a difundir o nosso Manifesto

Carta Aberta dos Familiares de Mortos e Desaparecidos em conjunto com organizações da sociedade civil e defensores da Democracia brasileira

Esta é uma carta de esperança, escrita por mãos e corações de brasileiras, e brasileiros, que contam com o dever do Estado de se retratar, de forma digna, com  familiares que perderam seus entes queridos, pelas mãos da violência perpetrada pelo terrorismo de Estado desde a ditadura militar. 

As primeiras manifestações exigindo o esclarecimento das circunstâncias das mortes e desaparecimento de pessoas, por motivações políticas, após o golpe de 1964, ocorreram ainda sob o forte aparato de repressão da ditadura civil-militar.  A busca desesperada que mães, irmãs, esposas e demais familiares empreenderam por delegacias e presídios, com a intenção de saber sobre o paradeiro de seus entes queridos, logo se tornou uma ação incessante e coletiva, que buscava exigir do Estado informações sobre os sequestros de pessoas, desaparecimentos e presos políticos que estavam sendo torturados, e assassinados. Muitas dessas mortes eram denunciadas clandestinamente pelos sobreviventes dessas barbáries ou por advogados que conseguiam transitar pelas prisões tentando resgatar prisioneiros.

A aproximação entre familiares decorreu desse forte movimento e necessária organização, para juntas poderem enfrentar a violência das ameaças, ou o descaso e o silêncio que lhes era oferecido como única resposta. Restava acreditar e seguir, criar estratégias amparadas pela justiça e pelas organizações nacionais, e internacionais, de direitos humanos, como: habeas corpus, cartas para as autoridades, petições e manifestos públicos, e assim também tentar preservar a vida daqueles que ainda estivessem retidos nas mãos da repressão.

Nós vivenciamos a luta de nossas avós, mães, irmãs e tias, familiares em ação por todo o país para reconstituir os passos das pessoas que ousaram levantar suas vozes contra um regime autoritário, que com a intenção de pará-los os sequestrou, aprisionou, torturou, esquartejou e ocultou. A luta iniciada por estas mulheres nunca terminou! Sempre foi por Memória, Verdade e Justiça. Infelizmente muitas delas já não estão entre nós, pois o tempo as venceu e as levou ainda carregando a dor da ausência, da indignação, das dúvidas e incertezas. E é diante do respeito a essa trajetória que brotam as sementes das novas gerações que somam forças na renovação necessária para a continuidade da luta, para que essas tristes laudas da história brasileira possam enfim ser contadas autênticas, e vistas com a vergonha, a aversão e a comoção social necessária para que nunca mais se repitam. Afinal, são quase 60 anos de buscas. Mais de 21.500 dias de espera, poucos avanços e muitos retrocessos, principalmente os ocorridos nos últimos sete anos. Infelizmente, neste curto período, vimos crescer rapidamente o ideal fascista e as políticas públicas – criadas com muito trabalho e esforço para alavancar os processos de redemocratização e justiça de transição – serem diretamente atacadas e parcialmente destruídas, ao serem ocupadas e afetadas por aqueles que as menosprezam.

Um dos mais ofensivos ataques é o que nos chega como o pior ato de retaliação do ex-presidente Jair Bolsonaro ao publicar no Diário Oficial, um dia antes de terminar o seu mandato, um relatório de finalização dos trabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), instituída por meio da lei nº 9.140 em 04 de dezembro de 1995, fruto resultante da luta dos familiares e de um longo processo político. Os trabalhos desta Comissão ainda são imprescindíveis para garantir o esclarecimento da Verdade, o resgate e a construção da Memória e a aplicação da Justiça contra a impunidade dos crimes cometidos. Não podemos aceitar que sigam nos torturando, negando as atrocidades do passado, excluindo o debate necessário no presente, para que possamos avançar nessa agenda que, ao contrário do que os que a negam, acreditamos que ela precisa ser ampliada, incorporando todas as violências cometidas pelo estado, incluindo as muitas vítimas que ainda não foram aprovadas, identificadas ou consideradas, devido à especificidade das situações e em que as violações foram, e seguem sendo cometidas.

Não há mais tempo para prolongar os efeitos do ato criminoso do ex-presidente Jair Bolsonaro de tomar como encerrados e conclusos os trabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Tivemos ciência da decisão de Vossa Excelência de anular este ato golpista, e restaurar os trabalhos da Comissão, pois foi amplamente anunciada há alguns meses pela mídia nacional e também diretamente comunicada a nós, familiares, pelo Excelentíssimo Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Senhor Silvio Almeida, em encontro conosco no dia 28 de março, em Brasília, durante os eventos da “Semana do Nunca Mais – Memória Restaurada, Democracia Viva”. Desde então aguardamos impacientes para que a volta da CEMDP se torne realidade. Não temos tempo a perder!

Não podemos mais ignorar esta malfadada herança da dor e da impunidade que se arrasta de governo em governo. Tal postura política acaba por prover uma sistemática multiplicação de atos bárbaros na atualidade, fazendo surgir as novas mães/filhas/tias/irmãs cujos entes queridos são corriqueiramente exterminados nas periferias do nosso país. Além disso, todos os dias recebemos a notícia de que uma liderança ou um militante dos direitos humanos, é assassinado.  

É preciso coragem e determinação para tornar coletiva a consciência desses obscuros dias que ainda nos atormentam no presente, para que possamos, enfim, trilhar um caminho que garanta que no futuro a democracia não seja facilmente abalada. A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos é um dos mais importantes instrumentos para realizar esta empreitada. Por isso, fizemos de nossa espera um ato de “esperançar”, no sentido freireano da palavra, de quem se ergue para lutar, para construir; se une para levar adiante sem nunca desistir. Assim construímos o Manifesto que anexamos a esta carta. Nele nos posicionamos com firmeza pela reinstalação imediata da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, com todas as garantias e condições necessárias – financeiras, administrativas e de pessoal – para que possa realizar todos os trabalhos que lhe são atribuídos. Neste Manifesto ampliamos nossa atuação; somamos forças com diversas entidades, coletivos e organizações; recebemos apoio de muitos parlamentares, artistas e pessoas da sociedade civil como um todo. Todos acreditamos na importância do retorno da CEMDP.

Confiantes de alcançarmos os objetivos que acreditamos serem também do desejo e interesse de Vossa Excelência, no sentido de tomar as atitudes e medidas corretas, e definitivas, para superarmos esta triste conjuntura, esperamos breve retorno a esta carta e às nossas solicitações.

 

Reinstala Já!

O MANIFESTO segue aberto à assinaturas, divulguem mais e mais, essa causa é de todos, todas e todes!

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